Crítica | Desejo de Matar é marcado por ação medíocre e roteiro problemático

Provavelmente os entusiastas de filmes de ação não vão enxergar os problemas que existe no roteiro de ‘Desejo de Matar’ (Death Wish), que está disponível na Netflix, já que o longa, estrelado por Bruce Willis (Duro de Matar), até entrega sequências convencionais de perseguição e tiroteio, porém, é em sua estrutura óssea que habita uma trama extremamente duvidosa, que flerta com ideologias controversas e com o fascismo, ao colocar o homem branco, americano, como uma espécie de herói, ao fazer justiça com as próprias mãos e, dessa forma, eliminar o “mal” da sociedade. Acontece que essa jornada de super-herói da vida real nada mais é do que um prato cheio para os apoiadores que acreditam fielmente que “bandido bom é bandido morto” e essa é a solução para diminuir a criminalidade no mundo, além de, claro, defender o porte de armas para o “cidadão de bem”. Ainda que seja um filme de ação para entreter, é fundamental que suas partes internas sejam destrinchadas para compreender se o que é consumido é, de fato, uma boa ideia.

Como filme de gênero, esse remake do original, lançado em 1970, segue a estrutura clássica do “filme de vingança”, como acontece com ‘John Wick’ e ‘Busca Implacável’. Obras cujo protagonista tem uma grande perda e decide se vingar, porém, o que faz ‘Desejo de Matar’ ser tão diferente dessas duas obras? A resposta está na construção da vingança e como o lado justiceiro domina o personagem, que se torna uma espécie de voz ativa para apoiadores dessa prática, já que, neste, o protagonista decide assumir um manto de “Anjo da Morte” e sair pelas ruas de bairros pobres fazendo o que acredita ser a justiça. Até mesmo sua vingança pessoal é deixada de lado quando ele decide limpar “a escória” da sociedade e, para piorar, acaba tendo o aval da polícia depois. Dessa forma, além de ter desenvolvido um herói para ser o porta-voz de ideais políticos da extrema direita americana, o diretor Eli Roth (O Albergue) não faz nada além de replicar fórmulas, já utilizadas em filmes de origem de super-heróis, distorcer perspectivas e nada mais que isso.

Inclusive, seja pela presença de Bruce Willis fazendo a mesma cara de durão sem emoção ou pelo fato de o personagem usar um capuz quando sai na rua para fazer “justiça”, há muitas semelhanças com a estrutura narrativa de filmes como ‘Corpo Fechado’ e até mesmo da série ‘Breaking Bad’, por exemplo. Não há novidades e nem surpresas. Quando sua família é brutalmente atacada, algo que aparentemente é uma justificativa para despertar seu lado “vigilante do crime”, a trama segue por caminhos mais densos e se afasta da proposta inicial, com isso, ao invés de compreendermos que suas atitudes são um reflexo da perda, como acontece em ‘Jonh Wick’, vemos basicamente um cidadão branco, de classe média alta, tratado forçadamente pela mídia como o “salvador”, que combate o crime e mata, sem pena alguma, qualquer um. Ok, ainda que possa lembrar a clássica personalidade do Batman, lembre-se que o Homem-Morcego tem a ideologia de não matar e faz questão de entregar os criminosos para a polícia, ou seja, aqui é a violência pelo prazer da violência injustificável.

Além dessas ideias controversas, todo o restante é terrivelmente executado. Há excessivos “Deus ex machina” para salvar o protagonista de situações perigosas, como uma absurda bola de boliche, por exemplo. O roteiro replica a estrutura de outras obras sem medo e não entrega nenhuma novidade, não se aprofunda e reforça estereótipos, a direção de Roth tem bons momentos, especialmente nas sequências de ação, mas ainda assim é fraca e vaga, além de desperdiçar o potencial de Willis que, francamente, está vivendo o mesmo personagem repetidas vezes já faz alguns anos. Fora isso, da metade para o final, a trama dá um nó e não parece sair do lugar, culminando em uma resolução apressada e anticlimática.

E é com muitos deslizes e uma tonelada de clichês que ‘Desejo de Matar’ fracassa até mesmo na ação que se propõe a fazer. Na tentativa de ser um filme de anti-herói movido por vingança, o longa acerta mesmo é na construção de um roteiro fascista, problemático e controverso, um total desserviço ao gênero. Bruce Willis, que vive o mesmo papel em todos os seus filmes recentes, é puro desânimo em cena. Para os amantes da boa ação, apenas vá assistir um filme criativo, diferente desse, que reforça ideias erradas e faz o espectador engolir goela abaixo suas mensagens falhas.

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