Crítica | ‘Golpe Duplo’ se sustenta apenas pelo carisma de seu elenco

Antes de fazer dupla em ‘Esquadrão Suicida’, Will Smith e Margot Robbie já faziam escola para ser bandido em ‘Golpe Duplo’ (Focus), que estreou essa semana no catálogo da Netflix. O ensaio para viver dois vilões da DC parece ter mesmo ocorrido durante a produção desse filme, que trabalha muito bem a dinâmica dos dois e a química entre eles. Porém, passa longe do habitual carisma que possuem, afinal, a trama se enrola de tal forma, que se perde antes mesmo que possa ficar interessante, ainda que a premissa seja curiosa. Semelhante ao bom ‘Truque de Mestre’, o roteiro entrega, inicialmente, algumas engenhosidades e ilusões, mas sempre de forma rasa e sem introdução, se tornando um emaranhado de situações absurdas, feitas apenas para envolver o espectador em sua teia de diálogos expositivos e reviravoltas forçadas.

A trama acompanha um trapaceiro profissional (Smith), que começa a trabalhar com a novata no ramo do vigarismo (Robbie) e, juntos precisam orquestrar uma artimanha elaborada, para lucrar em cima de um milionário de bobeira. Dentro dessa premissa, acabam se envolvendo romanticamente e colocam muitas ideias do plano a perder. Com isso, ainda que a narrativa ritmada consiga prender a atenção inicialmente, ao introduzir bem os personagens no submundo do crime organizado, toda explicação de seus atos soa superficial, apressada e fruto de artifícios de roteiro para surpreender o público com reviravoltas que não foram anunciadas antes, mesmo que em pequenas pistas. Ou seja, a ausência de elementos que indicassem as surpresas é uma manipulação barata, quase que covarde, de um roteiro extremamente fraco, mas que banca o inteligente.

Além dessa preguiça em devolver algo realmente intrigante e elaborado, há diversos outros problemas, especialmente na personagem de Robbie, estereotipada e sexualizada, de uma época em que Hollywood a queria como a “loira burra e gostosa”. Felizmente, a atriz é tão boa no que se propõe, que consegue subverter o papel de donzela e, no mínimo que o roteiro permite, entrega uma atuação cativante. Já Will Smith, ainda que seja um poço de carisma, faz um personagem mais do mesmo, sem nuances ou camadas, apenas uma superfície durona. De longe, um de seus piores filmes recentes. Já a direção da dupla Glenn Ficarra e John Requa (O Golpista do Ano) desperdiça oportunidades boas com cenas de ação precárias e usa energia demais na construção do romance criminoso, deixando de lado os demais elementos, como o suspense e a comédia, aliás, o humor até existe, pois o elenco é cômico, mas as piadas não emplacam e só servem para cortar ainda mais o clima intenso que poderia ser desenvolvido.

Por outro lado, Rodrigo Santoro (Westworld) está no filme e sua presença é fantástica. Há uma cena em que precisa ressaltar a personalidade perigosa de seu personagem e o ator faz com perfeição. Além disso, a montagem enérgica dá um ritmo bom para o filme, pelo menos até sua metade, quando começa a desandar e se enrolar, se tornando tedioso, até culminar em um desfecho tão medroso e covarde, que faz sua grande reviravolta parecer um enorme absurdo, já que um certo tiro em um certo personagem e sua sobrevivência após perder litros de sangue parece mais um golpe baixo do que um golpe duplo.

Dessa forma, ‘Golpe Duplo’ se sustenta precariamente pelo carisma de seu elenco, apesar de se assumir ser um “pipocão” sem profundidade, a diversão inicial acaba dando lugar a um desenvolvimento arrastado e um desfecho covarde. Se o seu objetivo era mostrar um mundo engenhoso do crime organizado, ironicamente perde o foco ao forçar um romance bandido furreca e sem química. O único golpe que vemos no roteiro é baixo, de tanta presepada artificial.    

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