Após o agravamento da pandemia do Coronavírus (COVID-19) pelo mundo, diversos filmes considerados “premonitórios” começaram a ganhar destaque, principalmente na Netflix, a maior plataforma de streaming acessada pelas pessoas que estão em casa, em isolamento social. E o suspense canadense ‘O Declínio’ (The Decline), assim como ‘O Poço’ e ‘Contágio’, é um desses filmes que estranhamente dialoga direto com a situação tensa que estamos vivendo nos dias de hoje, porém, a trama consegue inovar em alguns aspectos por não focar na degradação do mundo após uma pandemia, mas sim, na paranoia e no preparo de algumas pessoas para que um dia possam enfrentar a situação e sobreviver para contar a história, ou seja, a trama, de fato, mostra o declínio do ser humano diante de um momento em que é necessário escolher se será solidário ou individualista. E é essa a grande proposta do roteiro.
Como o mundo na trama não está passando por nenhuma dificuldade, os personagens são extremamente precavidos e absorvem diversas teorias de conspiração para se isolarem em uma espécie de acampamento, onde devem aprender técnicas de como sobreviver no eminente apocalipse. Como é de se esperar, esse confinamento começa a desandar quando as pessoas ali precisam, de fato, sobreviver após algumas reviravoltas. Com essa premissa intrigante e até mesmo criativa, a trama se desenvolve lentamente na construção do ambiente, do suspense e dos personagens rasos, no entanto, começa a se intensificar quando um dos personagens morre e tudo começa a ser uma verdadeira luta de vida ou morte. Se por um lado, o roteiro acerta em trazer novidades para o gênero, por outro, demora demais para avançar e acaba perdendo parte de sua até boa narrativa.
Outro destaque positivo é a direção da novata Patrice Laliberté que, apesar de esse ser seu primeiro longa-metragem, sabe dosar a intensidade do drama e do suspense e constrói cenas ótimas e nervosas, como uma briga no final, um dos pontos altos do filme. Apesar de grande parte da história demorar para avançar e a direção de fotografia ser excessivamente escura em cenas noturnas, algo que poderia ajudar na construção do terror psicológico e do suspense, mas que acaba sendo mais uma confusão de acontecimentos. Fora isso, a violência gráfica também é boa e necessária para uma história em que a luta pela sobrevivência é o foco. As mortes são rápidas, sem introdução e destemidas. O elenco entrega a emoção necessária, sem grandes ápices, destaque para Marie-Evelyne Lessard (O Carrossel Humano) e Réal Bossé (A Grande Sedução), que vive a personificação do terraplanista consumista de teorias da conspiração bizarras e fake news.
Mesmo tendo sérios problemas no ritmo, que afeta o desenvolvimento da trama, ‘O Declínio’ agrega alguma novidade aos filmes de sobrevivência, por propor debates sobre egoísmo, individualidade e até onde o ser humano pode ser capaz de ir para sobreviver quando a ideia de sociedade deixar de existir, ou seja, mais um filme premonitório, que dialoga diretamente com a pandemia do mundo atual. Alguns ajustes fariam total diferença e tornariam o suspense ainda mais enérgico e vigoroso. No demais, é uma boa escolha para assistir na Netflix nessa época em que precisamos reforçar a necessidade de nos importarmos com todos à nossa volta.