Crítica | ‘A Mula’ é apenas um drama com o carisma de Clint Eastwood

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Clint Eastwood é uma presença forte no cinema. Seja dirigindo seus filmes repletos de dramas sobre família e isolamento humano, ou mesmo atuando em muitos deles. Um fato é bem claro: seus 88 anos de puro talento o tornou uma relíquia de Hollywood e, mesmo em suas obras mais controversas e fracas, como o desastroso ‘15h17: Trem para Paris’, sua maestria cinematográfica é evidente e indispensável. Para a nossa sorte, Eastwood voltou a boa forma com o drama policial ‘A Mula’, que além de dirigir e produzir, estrela e encanta, com seu talento exorbitante e carisma sem igual, mesmo necessitando que alguns parafusos sejam apertados para que o longa funcionasse melhor, de forma grandiosa e na época adequada.

A premissa é bem simples: um senhor de idade acaba se envolvendo no transporte de drogas para outros estados nos EUA e começa a lucrar com seus serviços, até que a situação desanda, como é de se esperar. No entanto, a trama busca equilibrar o drama humano, sobre a vida de Earl Stone (Clint Eastwood) e como se afastou da família conforme foi envelhecendo, com a caçada estilo “gato e rato”, típica de filmes policiais, em que Colin Bates (Bradley Cooper) e Trevino (Michael Peña) precisam achar a tal “mula” que está levando toneladas de drogas consigo sem ser pego pela polícia. Além disso, o roteiro ainda encontra espaço para o humor ácido e piadas controversas, já que o ponto de vista da história parte de um senhor de quase 90 anos, que não se acostumou com a internet e nem se desconstruiu sobre questões raciais, machistas, sexistas (todas as mulheres do filme são estereotipadas!) e até mesmo homofóbicas, afinal, situações envolvendo esses assuntos são colocadas gratuitamente ao longo da trama para que alguma piada seja realizada, não havendo graça, mas servindo para exemplificar o mundo recluso e arcaico do protagonista.

O elenco é formado por talentos, mas que entregam o básico, com exceção de Dianne Wiest (Edward Mãos de Tesoura) e o próprio Clint, que possuem uma doce e melancólica química juntos, os demais atores como Taissa Farmiga (A Freira), Laurence Fishburne (Homem-Formiga e a Vespa) e Andy García (O Poderoso Chefão) estão presos aos seus estereótipos e só conseguem entregar o que o roteiro exige, aliás, põe estereótipos nisso, já que quase todos os “vilões” são tudo que se pode esperar de um típico latino envolvido no tráfico de drogas e os mocinhos são o mais alto nível de clichê policial, desperdício total do talento de Bradley Cooper (Nasce Uma Estrela) e de explorar o lado cômico de Michael Peña (Homem-Formiga).

Escolhas falhas à parte, nas camadas mais internas da trama há dilemas interessantes sobre família, solidão e altruísmo, tratados de maneira emocional pelo ponto de vista de Clint e seu talento em filmar diálogos elaborados e tocantes, não podendo esperar menos da mente criativa e melodramática que trouxe ‘As Pontes de Madison’ à vida. Aqui, seu personagem é o centro de tudo, assim como sua atuação é dedicada, divertida e carrega a trama para frente, quase que uma homenagem a sua própria filmografia e também uma chance de mostrar seu absurdo talento, mesmo com a idade avançada, apesar de sua falta de vontade de se adaptar aos tempos modernos ainda seja uma triste resistência. A direção de fotografia e a trilha sonora também estão em perfeita sintonia com a proposta do filme, às vezes com belas paisagens da região Centro-Oeste dos EUA, às vezes mergulhadas no caos interno e fechado do mundinho de Earl, que encontrou no perigo e no crime uma razão para viver.

Sendo assim, ‘A Mula’ é assistível, mesmo com deslizes e parafusos soltos. Sem dúvida diverte e emociona, mas é mais um filme preso apenas a presença marcante e ao carisma sem igual de Clint Eastwood, que recusa se modernizar, colocando todo o seu charme em obras feitas para outros tempos.

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