Crítica | Mindhunter: 1ª temporada

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Se tem um detalhe que chama muito a atenção quando Mindhunter está na discussão da mesa é o fato de que David Fincher é o grande nome por trás da série. Independentemente se a pessoa é fã ou não do estilo bastante peculiar do diretor, é fato que ele tem seus méritos como um cineasta importante para suspenses mais urbanos, psicológicos e vez ou outra com algumas reviravoltas bastante chocantes. Fincher é responsável por filmes como Clube da Luta, Seven: Os Sete Crimes Capitais e Zodíaco: todos filmes extremamente marcados – não apenas visualmente – pela assinatura bastante explícita do cineasta. Se todo esse repertório cheio ainda não fosse o suficiente para conferir a série, o próprio tema dela já chama a atenção: dois agentes do FBI que se propõem a traçar um perfil de “assassinos em série”, prometendo uma história muito mais densa e sóbria – e é justamente isso que é entregue. 

A trama da série acompanha a investigação dos dois agentes do FBI citados anteriormente, Holden Ford (interpretado por Jonathan Groff) e Bill Tench (vivido por Holt McCallany), que buscam traçar um perfil de assassinos em série (termo ainda não cunhado no dado momento do seriado) por meio de entrevistas efetuadas com os tais. Diferentemente do imaginável, a série dispensa episódios procedurais – os típicos episódios com começo, meio e fim, com vilões semanais que não acarretam em muitas consequências para a história geral -, apostando em uma história bastante intrigante, envolvente e demasiada psicológica – o que é ótimo. 

Inicialmente, o que mais impressiona é a maneira como a trama transcorre. É inevitável que o seriado remeta a Law and Order, The Mentalist ou Homeland, por exemplo – séries que apostam em um roteiro mais superficial, com histórias semanais, sem acarretar diretamente ao cânone -, mas não demora para que Mindhunter demonstre que é completamente diferente. As cenas de ação, perseguições policiais e violência gráfica são totalmente dispensadas por David Fincher – que é o principal nome dos bastidores -, apostando em desenvolvimento de personagens e em um roteiro que depende muito de diálogos extremamente subjetivos e de um avanço que acontece paulatinamente nos episódios, sempre dependente de conversas e experiências vividas pelos dois protagonistas. 

Fincher está no comando de quatro episódios da série, entretanto, sua marca visual e seu estilo de contar histórias estão presentes em todos os dez. Esse avanço gradativo da história se dá justamente pelo toque sutil, paciente e estrategista do cineasta. O fato de a série ser extremamente perturbadora em diversos momentos – principalmente por conta da densidade psicológica dos assassinos que é explorada durante as entrevistas – é fruto da habilidade do diretor em saber expor diálogos de uma maneira única: causando determinado efeito no seu público. A violência gráfica é totalmente dispensável por conta disso, porque o verdadeiro mote truculento está nas palavras e na naturalidade dos assassinos em exteriorizar seus pensamentos doentios, por exemplo. 

A trilha sonora – composta por Jason Hill – encaixa perfeitamente com tudo o que a série tenta transmitir. Assim como a aparente monotonia dos episódios, as músicas seguem a dança, com uma trilha bastante soturna, sóbria e detença. Além das clássicas músicas setentistas, que ajudam a se contextualizar no momento que os personagens estão na linha do tempo, os efeitos sonoros têm grande importância para dar um toque a mais para o seriado. Cada detenção dos assassinos possui sons característicos, os escritórios também possuem sua própria particularidade com o bater de teclados, clássicos de máquinas de escrever. Todo o som da série parece devidamente colocado com propósito e como recurso narrativo, além de apenas enfeite. 

“Não é necessário contratar estrelas, podemos criar algumas novas”, foi o que David Fincher falou acerca dos atores da série disse ao El País no Festival de Cinema de Londres, em que Mindhunter foi primeiramente apresentada. Felizmente, o que o diretor disse se aplica diretamente no seriado. Os dois atores principais, intérpretes dos agentes do FBI, são o grande destaque ao longo dos dez episódios – apesar de Anna Torv (intérprete de Wendy Carr) e Hannah Gross (que vive Debbie) também mostrarem a que vieram. Jonathan Groff consegue transmitir uma clara evolução – devidamente exigida pela trama – ao longo da temporada. Inicialmente o personagem caxias e totalmente antiquado, com o passar dos episódios – sempre paulatinamente – se torna alguém completamente diferente, muito mais esdrúxulo, paranoico e apresentando certos desvios de comportamento. Holt McCallany também dá um show mesmo que seja de uma maneira muito mais contida, apresentando um agente cansado, experiente e antiquado à sua maneira. Não é à toa que ambos carregam a série durante os dez episódios sem cair na mesmice, sempre inovando em sua dinâmica. 

Por mais que apenas uma temporada tenha se transcorrido, já é possível dizer algo bastante ousado: Mindhunter se tornou mais uma referência extremamente positiva na filmografia de David Fincher. Apesar da grande probabilidade do cineasta não continuar como showrunner na segunda temporada – devido às filmagens de Guerra Mundial Z 2 -, a série já merece um grande voto de confiança depois de uma estreia tão estonteante. Mesmo que o ritmo pausado do seriado não agrade todos, para aqueles que se aventurarem e realmente se conectarem com todos os diálogos maravilhosamente construídos, com os personagens muito bem desenvolvidos e com o suspense tenso e admirável de David Fincher, é quase impossível não se apaixonar pela série. Pode até demorar, mas assim como a série, eventualmente acontecerá.  

 

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