Crítica | O Ódio que Você Semeia – Poderoso drama racial emociona ao mesmo tempo que educa

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Uma das maiores e mais interessantes conquistas do cinema é conseguir encaixar boas histórias dentro de filmes fáceis, que alcançam um público jovem e iniciante, o tipo que não tem paciência para obras mais artísticas e elaboradas. Como é o caso de ‘O Ódio Que Você Semeia’ (The Hate U Give), aparentemente, um típico teen movie, mas não se engane, não há nada de típico neste longa, que esconde um poderoso discurso debaixo de suas muitas camadas, genialmente feito para repercutir dentro de cada um de nós e colocar para fora toda uma reflexão necessária e essencial.

A trama, adaptada do best-seller de mesmo nome, de Angie Thomas, é escrita quase que de forma didática, afinal, o objetivo é tanto informar quanto chocar o espectador que não está familiarizado com o cotidiano de Starr Carter (Amandla Stenberg), uma adolescente negra que vive uma história similar a de muitos jovens do país e do mundo, ao presenciar o assassinato de seu melhor amigo, Khalil, por um policial branco e ter sua vida retorcida completamente após ser ameaçada, tanto por traficantes de seu bairro, quanto por policiais. Apesar de toda a dor e medo, a menina encontra forças para se levantar e gritar por justiça, não fechando seus olhos para impunidade e a intolerância.

E a direção de George Tillman Jr. (Uma Longa Jornada) sabe bem direcionar a trama, pesada e difícil, para um caminho belo, utilizando muitos planos detalhes, que invadem a intimidade dos personagens, e algumas tomadas mais longas, para passar a devida emoção de cenas mais dramáticas. A direção de fotografia trabalha com tons amarelados e, mesmo que sutilmente, deixa os atores brancos ainda mais brancos, ressaltando a diferença de cor que a trama aborda. Já a boa e bem selecionada trilha sonora cumpre seu papel de emocionar na medida certa, elevando os sentimentos as alturas quando o roteiro exige tal sensação. Tudo perfeitamente equilibrado e funcionando em conjunto ao roteiro.

Porém, fica a cargo das atuações o maior acerto, em especial a jovem Stenberg (Mentes Sombrias), completamente envolvida com sua personagem e comprometida com a história, entregando um trabalho excelente e comovente, uma das melhores performances do ano. Fora isso, Regina Hall (Todo Mundo Em Pânico), a mãe da protagonista, mostra que é muito mais que uma boa atriz de comédia, e Russell Hornsby (Um Limite Entre Nós), o pai da menina, também merece destaque com uma atuação forte e honesta. Na verdade, é aquele delicioso caso em que todo o elenco funciona com uma boa química em cena e sabem a importância do texto que estão apresentando.

No meio de toda a perfeição técnica, o roteiro encontra espaço para ser divertido e romântico, porém, seu foco mesmo é tocar na ferida exposta que é a violência policial contra negros na américa (e porque não no Brasil também?), que são constantemente humilhados e assassinados a sangue frio por erros cometidos pela polícia. E, já que o objetivo é expor e educar, a trama astuta lida ainda com negritude, racismo, apropriação cultural, amor inter-racial e a difícil luta da comunidade negra e pobre para ser ouvida, tanto na mídia quanto no governo. Questões complexas, tratadas de maneira honesta e aprofundada, mostrando sempre bons exemplos, principalmente ao espectador que possa não se identificar com tais assuntos, um trabalho pontual para desconstruir paradigmas sociais e lapidar jovens e crianças que se interessam pelo filme.

O trabalho social é tão fundamental, que não nos sentimos como se estivéssemos em uma aula sobre como é ser negro, nós apenas vivenciamos o cotidiano de uma menina negra. A fluidez é tão doce a natural que nos tornamos parte dela, levando nossas emoções ao extremo do começo ao fim. ‘O Ódio Que Você Semeia’ é humano, realista e poderoso no que se propõe. É um filme sobre uma menina que encontra sua voz e, com ela, sua força para lutar pelo que é certo. Nada este ano será tão relevante e necessário quanto esse drama racial e, ainda bem que ele existe entre nós.

Nota: 9

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